Requião faz análise da sucessão de Lula em entrevista à "CartaCapital"

O governador do Paraná defende candidatura própria do PMDB, analisa indicações ao nome dele na sucessão presidencial, faz uma avaliação do governo Lula e ainda mede a possibilidade de seu partido unir-se em torno da pré-candidatura da ministra Dilma Rousseff.
Publicação
09/11/2009 - 19:00
Editoria
“Requião quer entrar no jogo” Sucessão: O governador do Paraná defende a candidatura própria do PMDB e se habilita A Sérgio Liro Difícil medir até que ponto a aproximação do PT com um seu velho adversário, o senador Osmar Dias, tem pesado nas criticas recentes do governador paranaense Roberto Requião ao pré-compromisso firmado entre o PMDB e o Palácio do Planalto para as eleições de 2010. Fato é que Requião, “lulista” segundo suas próprias palavras, há muito defende uma candidatura presidencial peemedebista. Inclusive postulou, sem sucesso, sua indicação nas disputas de 2002 e 2006. À época, como agora, o partido preferiu atrelar-se a outras legendas. Segundo o governador, o PMDB tem condições de oferecer um projeto alternativo de desenvolvimento. Carta Capital: Peemedebista do Sul defendem a candidatura do senhor a presidência. O senhor toparia? Roberto Requião: Caso todo o partido tomasse essa decisão, seria uma honra. Já postulei a indicação duas vezes e fui derrotado nas duas ocasiões, pois o PMDB preferiu apoiar outras candidaturas. Mas esse debate interno não me torna diferente. Quero deixar claro que sou e continuo lulista. Acho que o governo Lula trouxe avanços inegáveis na área social. Distribui renda, reduziu as desigualdades. Mas fez uma aliança como grande capital. O Brasil passou a ser administração de forma objetiva pelo Banco Central. Não há ninguém capaz, com esta estrutura, de formular e aplicar um plano de desenvolvimento, uma política trabalhista, um programa agrícola. Continuamos subordinados ao Consenso de Washington, mesmo neste momento em que o mundo assiste á falência do neoliberalismo. Acredito que a adoção de políticas sociais sólidas é um primeiro passo, a preparação para a retomada do desenvolvimento. CC: O senhor se declara lulista, mas é contra o pré-compromisso eleitoral firmado entre lideranças do PMDB e o Planalto. RR: As pessoas podem jantar juntas, se reunir. Mas, no caso, os representantes do PMDB tinham apenas o direito de escolher a sobremesa, no máximo. Não podiam submeter o partido a um compromisso não discutido internamente. Veja, não sou contra um acordo com o PT, apesar do comportamento deles aqui no Paraná (os petistas costuram apoio ao senador Osmar Dias, do PDT, adversário de Requião). É um acerto que só tem um objetivo aqui, abrir uma vaga para o senado a um nome do PT. CC: O que um candidato do PMDB poderia oferecer de diferente no atual cenário de polarização entre o PT e o PSDB? RR: Um projeto de país. O que somos e o que pretendemos ser? Um mercado para o desfrute dos outros ou uma nação para os nossos? Existe alguma diferença essencial entre o empreendimento colonial açucareiro que os portugueses montaram no nordeste brasileiro e o nosso papel de produtores de commodities hoje? mais ainda que diferença isso fez quando os holandeses se apossaram dos engenhos e passaram a comandar o processo de produção? Isso alterou em um átomo a realidade de vida dos brasileiros? Um candidato do PMDB faria a diferença ao apresentar proposta de um projeto nacional, desvinculado dos interesses do capital financeiro, das grandes corporações transnacionais, desse capitalismo pantagruélico, devorador de vidas, de nergia, de sonhos, de dignidade. Se vejo no meio de tal polarização PT-PSDB o Henrique Meirelles e toda aquela gente do Banco Central, não percebo qualquer divergência. Ao contrário, vejo um traço de união. Estabilidade, preservar os fundamentos macroeconômicos ..que os diferencia? Onde a polarização? São notáveis os avanços que o Presidente Lula impulsionou. No entanto, não podemos ficar presos ao papel de produtores de grãos e minérios para a exportação. Chegou a hora da construção de um projeto nacional que consolide a inclusão de milhões de brasileiros que o presidente Lula trouxe á mesa. Do contrário, logo, logo estarão de novo disputando restos. Pior ainda: vejo gente defender, sem qualquer constrangimento, a diminuição das ações de inclusão e de solidariedade, argumentando que “essa gente já comeu o que basta e “é hora de “cuidar do Brasil”. Quer dizer, retomar as privatizações, desregulamentar as relações trabalhistas, e aquela “modernização” todas dos anos FHC. CC: Caso não tenha candidatura própria, o senhor acha possível PMDB seguir unido e torno de uma candidatura de outro partido, da ministra Dilma, por exemplo? Ou será como sempre tem sido: parte da legenda apóia e parte faz oposição? RR: A unidade dessa federação de interesses que é o PMDB em torno de uma candidatura parece-me um tanto quanto difícil. Na verdade, já está rachado. Como você disse, “será como sempre tem sido”. Ainda assim acredito que a maior parte dos diretórios estaduais irá com a ministra Dilma, caso naufrague a ideia de candidatura própria. Da parte das bases do partido não há dúvidas ou divisões: a opção é pela candidatura própria. Talvez porque as bases tenham mais o sentimento de partido que a cúpula dirigente, sempre á disposição de acordos, de acertos. CC: Que avanços o governo Lula não fez e que precisam ser feitos pelo próximo presidente? RR: Quem ousaria negar avanços do governo Lula na área social? Quem ousaria negar a ele o grande mérito de ter trazido ao convívio da civilização, da modernidade, da contemporaneidade, dezenas de milhões de brasileiros? Pessoas com um prato de comida á mesa, apresentadas a um pedaço de carne, com dentes, com luz e água encanada em suas casas, calçadas, vestidas, lendo e escrevendo, freqüentando uma faculdade, morando com certa decência. Como negar esse extraordinário trabalho de inclusão? Foi tão significante esse avanço que tem gente torcendo o nariz, com saudade do cativeiro, disfarçando todo o preconceito de classe com aqueles surrados argumentos de sempre, aquelas histórias de ensinar a pescar em vez de dar o peixe. Depois de 500 anos, os pobres aproximaram-se da mesa e eles querem enxotá-los. Para que essa conquista se consolide e não haja retrocesso, temos de avançar com um projeto de nação, desvinculado dos interesses do mercado financeiro, do grande capital. Precisamos entender que o nosso destino se opõe, diverge em essência da globalização neoliberal. Precisamos entender que as políticas sociais hoje vigentes têm vida curta, um vôo de galinha, sem mudanças estruturais que redirecione o País. CC: Seria, para recorrer a uma imagem cara ao governador mineiro, Aécio Neves, um programa pós-Lula? RR: Não. Essa ideia do pós-Lula é um disfarce do antitulismo. O que os tucanos querem é voltar ao que havia antes a predominância do Banco Central sem as políticas sociais. CC: O Lula tenta fazer de 2010 uma disputa plebiscitária... RR: Com o Ciro Gomes, a Marina Silva e a Heloisa Helena na parada não será possível. O Lula não poderá dizer, por exemplo, que o Ciro, com enormes serviços prestadores a seu governo, virou de repente um antipetista. CC: O que o senhor acha da candidatura Ciro? RR: Ela embaralharia o cenário. Faria o Serra baixar de 30%, o que provavelmente levaria o governador de São Paulo a desistir da disputa.

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