Produção de energias alternativas não afasta condições cruéis de trabalho

Debate Energia e Estado joga luzes sobre as condições cruéis que se encontram os trabalhadores que cortam a cana na região Sudeste do País
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12/12/2007 - 19:10
Editoria
As condições degradantes e cruéis impostas aos trabalhadores rurais que se dedicam ao corte da cana-de-açúcar no Sudeste e Sul do País, apresentadas num documentário realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), dominou o debate Energia e Estado, da série Debates do Brasil realizado nesta quarta-feira (12) no auditório do Museu Oscar Niemayer, em Curitiba. Para o pesquisador da UFRJ, José Roberto Novaes, não se trata de se posicionar contra a produção de etanol, que é uma matriz energética renovável com cerca de 35 anos de tradição e de evolução tecnológica no País. “Muito menos temos interesse em denegrir o País”. Mas é necessário dar visibilidade à sociedade sobre as condições em que ocorrem a produção dessa energia antes de consolidar a produção brasileira no mercado internacional. O debate Energia e Estado desta quarta-feira, uma iniciativa da publicação Retratos do Brasil, do jornalista Raimundo Pereira, contou ainda com a participação de Francisco de Oliveira e Sergio Inácio Gomes, da Copel e de Bill Jorge Costa, do Tecpar. Para o jornalista Raimundo Pereira, a discussão jogou luzes sobre distorções existentes em nossa sociedade que estão se repetindo desde o período da ditadura. “A superexploração do trabalho humano na produção da cana-de-açúcar, de trabalhadores se deslocando pelo País sem controle de seu próprio destino por pura falta de oportunidades em suas cidades de origem é um assunto que precisa ser investigado com mais profundidade pela imprensa”. Segundo Pereira, essa série de debates será estendida para outras capitais do País numa tentativa de germinar a idéia de que os grandes problemas do País precisam ser apresentados sob a ótica onde haja mais de um ponto de vista ou de um retrato apenas marginal. Novaes, da UFRJ, enfatizou que o principal desafio a ser enfrentado na produção do etanol é encontrar soluções para o consumo de energia humana exigido no corte de cana. Cada trabalhador tem de atingir uma produtividade diária de corte de nove toneladas de cana por dia, cujo esforço repetitivo provoca forte impacto no organismo desses trabalhadores por meio de acidentes e doenças do trabalho. “É importante a sociedade tomar conhecimento das condições degradantes do trabalho nos canaviais onde muitos trabalhadores acabam morrendo por não conseguirem atender a pressão por produtividade”, afirmou. Novaes chamou a atenção ainda de que a maioria desses trabalhadores é jovens que não têm oportunidade de estudar na cidade de origem e nem na cidade de destino. Os trabalhadores que cortam a cana-de-açúcar neste País e ajudam a gerar uma energia renovável acordam ainda de noite e retornam também quase á noite. Se querem comer ou beber, se obrigam a fazer a própria comida no fim do dia de trabalho e levam água num canil, para enfrentarem um longo dia de sol escaldante. Não recebem nenhum benefício em alimentação e ainda são ameaçados com o corte da diária se não atingirem a produtividade imposta nos canaviais. Biocombustíveis - O engenheiro Sergio Inácio Gomes, que também representou o Sindicato dos Engenheiros (Senge), disse que essa realidade cruel também ocorre na produção de oleaginosas no Norte do País. Ele abordou os impactos ambientais na produção de grãos para a geração de biocombustíveis de interesse estratégico da nação. Segundo Gomes, é necessário ter visão e interesse estratégico para conquistar a independência energética que sustenta a soberania de uma ação. “Mas é importante também evitar a monocultura que gera a energia alternativa para evitar que as lavouras de cana-de-açúcar ou de oleaginosas ocupem espaços da produção de alimentos”, afirmou. Segundo Gomes, a produção de energia renovável no mundo atende apenas 13,5% das necessidades. “Sabemos que o planeta não tem condições de responder a atual demanda por energia sem recorrer aquela que é gerada por combustíveis fósseis”, afirmou. Gomes defendeu a necessidade de estruturar no Brasil um sistema de produção para reforçar a atuação da Agricultura Familiar na produção de energias renováveis e que atendam às especificações exigidas no mercado internacional. Bill Costa, do Tecpar, falou dos passos iniciais que estão sendo dados no País para a produção de biocombustíveis. Destacou que atualmente o grande gargalo da produção é a indisponibilidade de matéria-prima. A opção de utilizar o óleo de soja, oleaginosa mais produzido no Brasil é cara. O desafio é encontrar alternativas que não competem com a produção de alimentos, destacou. “Fazer biodiesel é fácil, difícil é fazer um combustível que atenda os interesses dos produtores e consumidores”, finalizou.

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