Museu Oscar Niemeyer abre exposição sobre a revolucionária psiquiatra Nise da Silveira

Caminhos de uma psiquiatra rebelde reúne 300 obras entre pinturas, desenhos e esculturas além de arquivo documental
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22/10/2008 - 12:30
Editoria
O Museu Oscar Niemeyer abre neste sábado (25), às 11h, a exposição Nise da Silveira – Caminhos de uma psiquiatra rebelde para convidados e público em geral. Durante o evento, o Museu permanecerá com a bilheteria franqueada entre 10h e 12h. São 300 obras entre pinturas, desenhos e esculturas além de arquivo documental impresso, fotografias e depoimentos que narram o percurso dela. A mostra tem o patrocínio da Copel e apoio do Ministério da Cultura, do Governo do Paraná e da Caixa Econômica Federal. A psiquiatra Nise da Silveira (1905-1999) revolucionou o tratamento para doentes mentais no Brasil e foi uma personalidade brasileira, na ciência e nas artes plásticas. Sua construtiva trajetória em instituições psiquiátricas, com a implantação de oficinas de arte para o acompanhamento e o tratamento dos internos, resultou em uma produção artística reconhecida, de autoria dos próprios pacientes. A trajetória profissional de Nise é o foco desta exposição. Instalada em duas salas, a primeira apresenta os fatos históricos que levaram a médica a contestar os paradigmas da época, como a aplicação de choques insulínicos, de eletrochoques e a realização de lobotomias. A ditadura Vargas, da qual a médica foi vítima, aparece como pano de fundo. O fio condutor é a fala da própria psiquiatra, retirada de textos de entrevistas e de depoimentos em diversas formas de mídia. Fotografias, reproduções de manchetes de jornais e vídeos criam a ambientação para a segunda sala. Pacientes e artistas - As pesquisas desenvolvidas por Nise da Silveira e os conhecimentos gerados são apresentados na seleção de obras do acervo do Museu de Imagens do Inconsciente, que reúne significação simbólica e beleza estética, de acordo com o curador e diretor do museu carioca, Luiz Carlos Mello. Os trabalhos são de autoria de oito pacientes que freqüentaram os ateliês da Seção de Terapêutica Ocupacional, criado pela médica em 1946, no Centro Psiquiátrico Pedro II, com sede no Rio de Janeiro. O Centro hoje é denominado Instituto Municipal Nise da Silveira. Mello organizou a exposição de forma que o observador acompanhe diferentes temas, como o trabalho produzido por Lúcio Noeman (1913) antes e depois de ser submetido à lobotomia. “São obras que comprovam a ruína da criatividade, da abstração, do geometrismo, e contradizem a visão da psiquiatria tradicional em relação à afetividade, com imagens que se tornaram um marco na história da arte brasileira”, disse. A vivência do espaço, em diferentes momentos de percepção da realidade do ateliê de pintura, é retratado por Emygdio de Barros (1895-1986). Enquanto que as esculturas de Adelina Gomes (1916-1984) remetem, segundo o curador, ao neolítico, em uma verdadeira arqueologia da psique. A exposição também exibe as representações recorrentes de mandalas, imagens circulares, que “abriram as portas para a compreensão das forças autocurativas da psique”. A importância do contato afetivo, “em ambiente favorável e de respeito”, na construção das personalidades criadoras, é evidenciada nas obras de Carlos Pertuis (1910-1977), com seus personagens; de Fernando Diniz (1918-1999), em seu geometrismo multifacetado; de Isaac Liberato (1906-1966), em seu colorido vibrante; de Octávio Ignácio (1916-1980), com suas cenas inusitadas; e de Raphael Domingues (1913-1979), em pinturas e desenhos que testemunham suas composições espontâneas. BOX – A ciência como ponte para a arte Humanista e libertária, em centros de tratamento sem grades, Nise da Silveira introduziu seus novos métodos na década de 1940, quando nem se discutia a humanização dos manicômios. Adotou a arte como um meio de compreensão e uma alternativa para tratar a loucura sem utilizar os procedimentos convencionais. Tornou-se um marco. Por um período trocou correspondências com Jung, discípulo de Freud e famoso por sua pesquisa sobre os sonhos e os símbolos. Jung incentivou Nise a exibir as obras de seus pacientes no 2º Congresso Internacional de Psiquiatria (1957), em Zurique (Suíça). Diante de imagens ainda tão enigmáticas, orientou a médica que estudasse mitologia, como chave para a compreensão das obras criadas pelos internos. Inicialmente destinada ao estudo científico, a produção dos pacientes foi tão abundante que surgiu a idéia de reunir as obras em um museu. Assim, em 1952, o Museu de Imagens do Inconsciente foi inaugurado. Hoje, apontado como um dos mais importantes do mundo, no gênero, seu acervo constitui um verdadeiro mapa antropológico da psique humana. Pela importância para a cultura brasileira, em 2004, a coleção foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A repercussão do rico e profundo trabalho desenvolvido por Nise da Silveira influenciou o surgimento de pesquisas e instituições semelhantes em outros estados, como Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Bahia e até na Europa, como Portugal, França e Itália. O método de trabalho no Museu de Imagens do Inconsciente consiste, principalmente, no estudo de séries de imagens. De acordo com os especialistas, isoladas, parecem indecifráveis. Porém, organizadas em séries de imagens de um mesmo indivíduo, permitem aos terapeutas e pesquisadores melhor compreensão dos desdobramentos de processos intrapsíquicos e do quadro psicológico do paciente. Outras seleções reúnem temas de incidência freqüente em diversos casos clínicos, como mandalas, rituais, metamorfoses e animais fantásticos, entre outros. Polêmica - no início da década de 1950, alguns críticos de arte se negaram a reconhecer o trabalho feito pelos pacientes. O crítico Mário Pedrosa caminhou contra a corrente. Ele criou, a partir dessa experiência, o conceito de arte-virgem. Em busca de uma designação para esse modo do fazer arte, surgiram outras denominações como arte-bruta ou outside. Enfim, para Pedrosa serviu para definir a arte que não é forjada em escolas, realizada por autores sem formação artística. “Pedrosa reconheceu a qualidade estética nos trabalhos de alguns autores, classificando-os como verdadeiras criações artísticas”, lembra Luiz Carlos Mello, curador e diretor do museu carioca. Segundo ele, Pedrosa argumentava que “o artista não é aquele que sai diplomado da Escola Nacional de Belas Artes, do contrário não haveria artistas entre os povos primitivos, inclusive entre os nossos índios”. O curador trabalhou ao lado da psiquiatra Nise da Silveira durante 27 anos e produziu 15 documentários sobre as pesquisas científicas desenvolvidas por ela. “Os trabalhos, dentro do tratamento terapêutico, são como fotografias, instantâneas, do mundo interno, do inconsciente dos pacientes. Além de serem fontes de estudo sobre a situação psíquica de seu autor, muitos desses trabalhos têm qualidades estéticas.” Serviço: Nise da Silveira – Caminhos de uma psiquiatra rebelde Patrocínio: COPEL Visitação: de 25 de outubro a 01 de março Museu Oscar Niemeyer Rua Marechal Hermes, 999 Aberto de terça a domingo, das 10h às 18h R$ 4,00 inteira e R$ 2,00 estudantes Gratuito para grupos agendados da rede pública, do ensino médio e fundamental, para estudantes até 12 anos, maiores de 60 anos e no primeiro domingo de cada mês.

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