Lei da Anistia não apaga crimes da ditadura
(*) Waldyr Pugliesi
Nestes últimos dias tivemos dois eventos distintos, mas emblemáticos para quem vivenciou a ditadura militar e sofreu com a luta pela volta da democracia em nosso país. Na segunda-feira, 4 de maio, o Superior Tribunal de Justiça, o STJ, antecipou o julgamento de uma ação que corria no Supremo Tribunal Federal, o STF, e condenou a União a indenizar em R$ 100 mil as filhas de Álvaro Eugênio Cabral, ex-vereador do município de Rolândia. Na terça-feira, 5 de maio, participei da entrega de indenizações a ex-presos políticos do Paraná, momento que ficou marcado pela forte emoção dos presentes.
Estes dois acontecimentos nos levam a uma dedução muito clara, a Lei da Anistia, que foi sancionada em 28 de agosto de 1979, ainda durante o regime discricionário, não apagou e não apagará aquelas atrocidades cometidas contra o povo brasileiro. Na decisão do STJ, três ministros entenderam o caso como um crime contra a humanidade e, por isso mesmo, imprescritível. E eles buscaram, através do voto, reparar os atos virulentos praticados contra a família e contra o ex-vereador de Rolândia, preso em 1964, no primeiro ano da contra-revolução que golpeou os movimentos políticos e sociais do país.
No parecer do relator da ação, o ministro Luiz Fux, ficou muito claro que é inquestionável a responsabilidade da União pelas consequências da prisão política de Álvaro Eugênio Cabral. O entendimento dos ministros é idêntico à tese defendida pelo Ministério Público de São Paulo, de acionar a Justiça para punir ex-comandantes do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna, o famigerado DOI-Codi, acusados de violações aos direitos humanos, como prisão ilegal, tortura, homicídio e desaparecimento forçado de pessoas durante o regime.
Citei esta decisão do STJ durante a entrega de cheques indenizatório aos ex-presos políticos para mostrar que assim como os ministros, entendo que estes crimes contra aqueles que não aceitaram a imposição de um regime ditatorial, são imprescritíveis. Da platéia assistia a tudo a senhora Maria Botelho, uma das vítimas do regime ditatorial em nosso Estado, que trazia estampado em sua face os reflexos das agressões que sofreu.
Ao ver a figura tão desgastada de Maria Botelho indaguei: que tipo de risco uma pessoa tão frágil poderia oferecer ao regime militar? O que é que estes detentores do poder fizeram com o povo brasileiro? Não dá para a gente ficar no esquecimento. Outros personagens que junto comigo enfrentaram os anos de chumbo daquele período também se faziam presentes na solenidade. Um deles, Antônio Carlos Novaes Pimpão Ferreira, era praticamente uma criança quando junto com seu pai, Albor Pimpão Ferreira, lá de Arapongas, foram presos pela ditadura militar.
Outro caso que ainda hoje está muito presente em nossas mentes foi o assassinato do doutor Ornellas, cujo corpo não pode ser visto por ninguém, nem mesmo amigos e familiares que gostariam de prestar uma última homenagem. O doutor Ornellas voltou de Brasília encaixotado. Para impedir qualquer tipo de manifestação, os detentores do poder montaram um aparato inusitado.
Os jornais que destacaram o julgamento do STJ informaram que um documento derrubou a versão inicial dos militares no caso do deputado Rubens Paiva. Até hoje não foram encontrados seus ossos e durante todo este tempo o regime militar mentiu descaradamente. Esta mentira só caiu após muitas pesquisas em busca da verdade. O deputado Rubens Paiva foi na verdade assassinado. Não tenho dúvida que estes crimes que foram praticados pela ditadura e tantos outros são sim crimes contra a humanidade e precisam ser punidos.
(*) Waldyr Pugliesi é deputado estadual, líder do PMDB na Assembléia Legislativa e presidente do Diretório Estadual do PMDB (www.waldyrpugliesi.com.br – e-mail waldyr@waldyrpugliesi.com.br)