Justiça acata denúncia contra governo Lerner por contrato ilegal na Celepar

A denúncia envolve crimes como formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro e aponta prejuízos aos cofres públicos de no mínimo R$ 628 mil
Publicação
21/12/2009 - 19:00
A Vara Criminal do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba aceitou denúncia do Ministério Público contra 11 pessoas – entre elas o ex-governador Jaime Lerner e o ex-secretário de Governo José Cid Campelo Filho – por contratação ilegal da Associação dos Diplomados da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (Adifea), por parte da Celepar. A denúncia envolve crimes como formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro e aponta prejuízos aos cofres públicos de, no mínimo, R$ 628 mil. A denúncia foi aceita no último dia 14, pela juíza Angela Regina Ramina de Lucca (conforme se pode verificar em despacho que segue em arquivo anexo). No documento, com quase 70 páginas, o Ministério Público do Estado do Paraná destaca que a Adifea – pela “aura de credibilidade” - foi utilizada como “testa de ferro” para as ações criminosas dos 11 denunciados. “Servia-se a Adifea/USP como sumidouro dos recursos auferidos, pela organização criminosa, ao erário de empresas ligadas à administração pública paranaense, absorvendo o pagamento de contratações realizadas à margem da legalidade e serviços não prestados ou porcamente prestados”, diz a denúncia. COMO OCORREU - A Adifea fora contratada pela Celepar para, entre 2001 e 2002, realizar serviços de “levantamento, revisão e recuperação de tributos, contribuições e ativos financeiros”. Firmado em 22 de maio de 2001, o contrato durou até 22 de agosto do ano seguinte, quando foi rescindido, por aconselhamento do Tribunal de Contas do Estado, que já constatara irregularidades. Por esses serviços, a Celepar pagou à Andifea R$ 291.911,06. A companhia obteve, de fato, compensações tributárias, no valor de R$ 1.621.728,16, demonstra a denúncia. Entretanto, os mecanismos que levaram a essas compensações foram, posteriormente, questionados pelo Fisco, e a Celepar se viu obrigada a restituir R$ 1.957.183,98 em salário-educação (ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e em Imposto de Renda, Confins e Pasep, à Secretaria de Receita Federal (SRF). “Em razão de inspeção realizada pelo FNDE e dos procedimentos administrativos instaurados pela SRF para a recuperação dos valores compensados indevidamente, a Celepar arcou com um hipotético prejuízo final da ordem de R$ 627.366,88 (...) Como sempre ocorre quando não há uma cristalina diferenciação entre público e privado, referido prejuízo segue, até o presente, pendente de ressarcimento”, salienta a denúncia do MP. LAVAGEM DE DINHEIRO - O documento do Ministério Público evidencia ainda indícios de lavagem de dinheiro. Levantamento que consta na denúncia mostra que dos R$ 291.911,06 recebidos pela Andifea, da Celepar, quase 90% (R$ 256.712,66) foram parar em contas de pelo menos 11 pessoas, entre físicas e jurídicas. “Paulatinamente sacramentado o desvio de recursos da Celepar, cumpria aos denunciados a ‘lavagem’ do dinheiro obtido no golpe, para posterior repartição entre os integrantes da organização criminosa.” Confira, no arquivo anexo, a denúncia e reprodução do despacho em que a juíza aceita a denúncia. BOX 1 Resumo da denúncia - Denunciados: além do ex-governador Jaime Lerner e do ex-secretário José Cid Campelo Filho, a denúncia envolve os seguintes integrantes do governo Lerner: Mário Edson Pereira Fischer da Silva, Lúcio Alberto Hansel, Gilmar Santos Pereira e Eluani de Lourdes Snege; e ainda Maurício Roberto Silva, à época, sócio-proprietário da empresa Embracon; Antônio Pinheiro Sampaio Menezes, sócio-proprietário da consultoria Exitus; Pedro Antônio Bittencourt Pacheco, e atuava em conjunto com os dois anteriores; e José Guilherme Hausner e Gil José Pace, respectivamente presidente e diretor administrativo da Andifea. - Crimes denunciados: associação em quadrilha ou bando; crime da lei de licitações, peculato e lavagem de dinheiro. BOX 2 Denúncia traz os mesmos envolvidos do caso Andifea-Copel A ilegalidade na contratação da Andifea pela Celepar se assemelha a outro caso envolvendo a mesma instituição, o caso Andifea-Copel. Em março de 2001, foi firmado termo de cooperação técnica — chamado de contrato guarda-chuva — para que a Adifea prestasse, sem licitação, serviços de consultoria, levantamento e ajuste nas áreas de recursos humanos e de tributação da administração direta e indireta do Estado. O termo de cooperação foi feito em processo administrativo, que tramitou na Secretaria de Governo. Porém, a Adifea era uma associação sem fins lucrativos, voltada à pesquisa e de notória especialização. No Paraná, a Adifea era representada por Maurício Roberto Silva, presidente da Federação Espírita do Paraná e proprietário da Embracon, e Antônio Pinheiro Sampaio Menezes, proprietário da Exitus Consultoria e Planejamento Tributário, com sede em Curitiba e Brasília. No entanto, os administradores e técnicos da Adifea nunca estiveram em Curitiba para tratar do contrato ou prestar qualquer serviço. Com base no contrato guarda-chuva, a Copel teria formalizado acordo com a Adifea para levantamento de créditos tributários. Maurício Silva e os demais acusados teriam usado planilhas atualizadas de um trabalho anteriormente realizado pela Copel e apresentado uma sugestão de aproveitamento dos créditos de ICMS incidente sobre as tais operações de aquisição. Pela sugestão do plano, a Copel teria pago à Adifea honorários no valor de R$ 16.809.434,08. Segundo a denúncia, o dinheiro entrou na conta da Adifea, voltou no dia seguinte para a conta da Embracon e foi transferido para diversas contas, com a participação de doleiros de Londrina e Rio de Janeiro. Tudo teria sido coberto por contratos de aparência, em processo de lavagem de dinheiro. O caso tem 15 réus envolvidos e está atualmente na 8.ª Vara Criminal de Curitiba, em fase de interrogatório.