Jornalista afirma que Requião é vítima do terrorismo midiático

Diretor da Telesur comenta que a América Latina vive novo panorama nos meios de comunicação
Publicação
28/04/2008 - 14:26
O diretor da Telesur, o jornalista Beto Almeida, disse nesta segunda-feira (28) que a América Latina está vivendo novo panorama nos meios de comunicação. “É o surgimento, o nascimento, o fortalecimento e a expansão de tevês e de rádios comprometidas com a missão pública humanizadora e civilizatória de bem informar. O exemplo disso é que a parceria feita pela Telesur com a TV Paraná Educativa - uma tevê do estado comprometida com a missão pública, conforme diz a constituição”, afirmou Almeida, coordenador do Painel Democratização dos Meios de Comunicação. Almeida comentou que a parceria entre a Paraná Educativa e a Telesur “é um instrumento poderoso de integração, de irmanização entre nós, de solidariedade, de cooperação, tal como está na constituição de vários países”. O jornalista disse que a América Latina precisa que os meios de comunicação atuem favoravelmente a um processo civilizatório de cooperação e de integração “e não através deste terrorismo midiático que é feito contra todos os governantes que ousam defender os interesses populares”. “Nós vimos como tem sido vítima de um terrorismo midiático, desta tirania midiática privada, o governador Roberto Requião. Ele tem sido vítima, porque combate os monopólios, assim como Evo Morales, e como o presidente Chávez, que é vitima de um terrorismo midiático internacional”, apontou Almeida. “Por isso, cada vez mais devemos encarar a comunicação como alvo estratégico fundamental, como ferramenta para criarmos uma civilização que precisamos fora do mercado. Uma civilização que seja de políticas públicas, de integração entre as pessoas, dos povos e de uma humanidade livre dessa escravização mercadológica, hoje sustentada por esse terrorismo midiático, que apenas assegura a rapina das nossas riquezas naturais e a destruição da nossa cultura. E a comunicação é um instrumento de libertação, para isso, é preciso fortalecer, expandir, consolidar e aprofundar o canto público da comunicação”, completou. TELESUR - Funcionando desde 2005, a Telesur (TV Sul), através de programação em espanhol e português, promove a integração latino-americana. A emissora surgiu antes da criação da TV Brasil e compartilha o processo de fortalecimento de integração do continente e incentiva o intercâmbio de informações entre os países. “É um olhar totalmente diferente. É o olhar latino-americano sobre a realidade latino-americana, que tem uma agenda informativa totalmente diferente da que nós recebemos do norte”, disse Ovídio Cabrera, diretor-geral da Telesur. “As grandes corporações nos mandam uma imagem única. Nós só aparecemos como notícia quando há algum desastre. No norte, a visão é em preto e branco e nós somos um continente multicolorido, cheio de diversidade e pluralidade”. A rede sul-americana, com sede em Caracas, é financiada pelos governos da Venezuela, Argentina, Uruguai e Cuba e conta com correspondentes nesses quatro países e também no Brasil, na Colômbia, no México e nos Estados Unidos. A Telesur tem convênio firmado para troca de programas e informações com a TV Paraná Educativa. BOX – Entrevista com jornalista brasileiro Beto Almeida, diretor multinacional da Telesur Como é um canal que tem uma visão alternativa à grande mídia? Beto Almeida - A Telesur é uma alternativa aos milhões de latino-americanos que querem uma informação diferente, que não seja submetida às televisões comerciais que tem seus critérios determinados pelos interesses dos seus grandes anunciantes. Nós estamos fazendo uma televisão em favor da integração dos povos latino-americanos. Estamos fazendo uma TV em favor da cultura, sem baixaria, sem culto à violência, resgatando a memória e a história dos povos latino-americanos e conseguindo, através disso, provar que é possível fazer da televisão uma ferramenta inteligente elevando a educação, a cultura, divulgando todos os vídeos do cinema americano que hoje não encontram espaço de exibição e que encontram na Telesur uma grande janela de exibição: documentários da Argentina, da Colômbia, do Brasil, do México que estão engavetados que não têm onde ser exibidos. Como isso ocorre, você falou, inclusive, do cinema nacional que não tem espaço nos canais comerciais? Beto Almeida - O cinema latino-americano, em função do controle de 85% do audiovisual norte-americano sobre o mundo, não tem onde ser exibido, não encontra espaço de exibição. Na Telesur tem esse espaço. Não há uma televisão dessa natureza, que trabalhe em favor da integração. Isso está na Constituição dos vários países latino-americanos. Por exemplo, na Constituição brasileira está a integração latino-americana como uma das metas da nação brasileira. Isso precisa de uma integração também no plano da cultura e da informação. É isso que a Telesur defende e cumpre. A Telesur surgiu para pagar a dívida informativa que se construiu e avolumou contra os povos dessa região. É um olhar mais profundo em direção a América Latina? Beto Almeida - Nós olhamos a América Latina com nossos próprios olhos contra a predominância do olhar do norte. Mas eles nos olham com os interesses deles. Eles não nos olham tentando resgatar a nossa auto-estima, pelo contrário. O nosso olhar é um olhar de identidade e respeito à nossa história. À trajetória de luta dos povos pela libertação econômica, pela emancipação cultural. É um olhar sobre nós mesmos, inclusive, projetando esse olhar para o mundo, para que o mundo tenha uma outra possibilidade de nos enxergar. Para ver que a América Latina tem potencialidades; tem direito de escolher seu próprio caminho, tem direito de organizar sua própria sociedade. Precisa da união dos vários povos para superar seus problemas de miséria, dependência tecnológica e cultural. A Telesur coloca em tela de forma aberta e gratuita. Nós somos uma TV pública que não tem nada a ver com os interesses de mercado ou de lucro. A Telesur é um canal bilíngüe e trata também essa questão da língua e da cultura? Beto Almeida - O general Abreu e Lima, pernambucano que lutou ao lado de Bolívar é um herói na Venezuela e é desconhecido no Brasil. Ele voltou para o país depois de ter participado da Revolução Praieira. Ele voltou ao Brasil no momento que Bolívar havia morrido. Ele escreveu muito, defendeu idéias muito importantes quando voltou ao Brasil. Mas quem conhece a história de Abreu e Lima no Brasil? Nós vamos contar essa história. Nós contamos para os bolivianos quem foi Tiradentes. Contamos aos colombianos que foi Zumbi dos Palmares. Isso já mostra um outro olhar, uma outra narrativa e uma outra linguagem. Mas isso precisa começar pelo respeito aos idiomas. Por isso temos uma programação bilíngüe. Espanhol e português. A Telesur não teme ser taxada de imparcial? Beto Almeida - Não existe imparcialidade. As grandes mídias não são imparciais. Elas são favoráveis à defesa de programas econômicos neoliberais, defendem a continuidade da desnacionalização da economia, de planos econômicos que levaram a América Latina a viver essa situação de miséria. Isso não é imparcialidade. Nós tampouco somos imparciais. Somos independentes porque não temos vinculação com agentes interessados no lucro. Nós defendemos aquilo que está preconizado nas constituições dos países: a integração latino-americana. A Telesur também faz um jornalismo diferente de outros veículos? Beto Almeida - Esse jornalismo tem uma diferença. Por exemplo, hoje não se sabe que a Venezuela foi declarada, pela Unesco, território livre de analfabetismo. Essa notícia não teve destaque nas grandes mídias. Por que será? Não é por imparcialidade. Esse silêncio, essa sonegação de informação tem interesse em demonstrar que o que está acontecendo na Venezuela não deve servir de exemplo para outros povos. Da mesma forma que ninguém quer mostrar que a solução encontrada pela Argentina para a renegociação da sua dívida externa, que disse que só honraria 70% das suas dívidas. A grande mídia não atuou de forma imparcial. Ela disse que aquilo seria uma catástrofe. Um absurdo. Que a Argentina estava caminhando para o desastre. E não aconteceu nada disso. Ela foi muito bem-sucedida nessa renegociação da dívida. A economia da Argentina está se recuperando. Houve aumento de salários, das pensões dos aposentados. A indústria está tendo uma reanimação muito importante. As grandes mídias não quiseram e não querem dar destaque a essa recuperação porque na Argentina está se aplicando um programa diferente do que a grande mídia gostaria que fosse aplicado. Ele não tem nenhuma imparcialidade. Eles têm total parcialidade. Como trabalhar essa informação que não chega ao grande público? Beto Almeida - Vamos tomar o caso da informação, por exemplo. A grande mídia no Brasil recebeu uma verba publicitária tão grande para fazer a propaganda dos transgênicos que ela nunca pôde informar realmente o que acontece com a opção ou imposição das sementes transgênicas. O Brasil consegue vender a soja não transgênica, a soja limpa, que é produzida no Paraná, onde é proibida a plantação de soja transgênica com um preço muito melhor no mercado internacional que a soja geneticamente modificada. Uma vantagem comparativa que a multinacional Monsanto, que pagou grandes somas de publicidade para a grande mídia, não quer ver publicada. Ela quer ter o controle da produção agrícola brasileira através das sementes. Para transmitir essa informação é necessário ter independência. Nós vamos informar fatos que estão sendo sonegados. A Telesur mostra os heróis esquecidos pela grande mídia? Beto Almeida - Isso mesmo. Mostramos quem foi Bolívar, quem foi Abreu e Lima, quem foi Zapata, quem foi Tupac Amaru, quem foi Martin Hierro. Todas as histórias e lendas da América Latina que são sufocadas para que as nossas crianças vejam apenas as histórias e lendas dos Estados Unidos e de outros países. Nós temos histórias de lendas e cultura de sobra que estão sendo destruídas e nós resgatamos isso. Esse é um trabalho de formação. A programação para as crianças também tem um foco diferente? Beto Almeida - Temos uma outra narrativa televisiva. Por que a televisão tem que excluir a participação das crianças? Por que ela apenas considera a criança como consumidora? A criança só é interessante para a TV comercial quando ela é consumidora para comprar sapatos, bombons, refrigerante e alimentação que gera uma série de problemas de saúde. Nós fazemos propaganda de remédios que não têm comprovação terapêutica, como faz a TV comercial. Nós não induzimos a população ao consumo excessivo ou à auto-medicação consumindo remédios que podem levar à intoxicação e a outros graves problemas. É um absurdo que se permita isso no Brasil. Por que? Porque as grandes redes, não apenas no Brasil, mas em muitos outros países a indústria farmacêutica controla a publicidade das TVs comerciais. A Telesur não faz isso. Nós não temos anunciantes. Nós discutimos tantas outras coisas que não são colocadas pela TV comercial, que temos a liberdade de fazer essa criação e recriação e também uma linguagem que pode ser muito mais divertida, leve e audaciosa. A Telesur, nesse sentido, é um laboratório de experiências para recriar uma linguagem, uma narrativa televisiva que seja mais leve. Que tenha as cores da América Latina. O barulho da América Latina. O ruído da América Latina. A música latino-americana que hoje é dificilmente encontrada na própria televisão que hoje dá prioridade muito grande para a música norte-americana. Nós vamos ter uma estética latino-americana; de cores latino-americanas, ruídos, fala, lugares e personagens latino-americano. Como a Telesur se mantém, se não tem anunciantes? Beto Almeida - Ela é mantida pelos quatro países que patrocinam, que dão sustentação a Telesur. Esse é uma emissora multinacional pública. Ou seja, dos quatro países – Venezuela, Argentina, Uruguai e Cuba. Ela não tem anúncios e é sustentada com dinheiros dos povos. Recursos do orçamento que é criado pelo contribuinte dos quatro países. Esses países que tem seus governos sustentados pelos recursos dos contribuintes que pagam impostos e que dão sustentação financeira para a Telesur. Quanto já foi investido até o momento para colocar a Telesur no ar? Beto Almeida - Aproximadamente US$ 12,5 milhões; US$ 10 milhões de investimentos iniciais e mais US$ 2,5 milhões de orçamento que foram aplicados na compra de produção audiovisual independente. Os produtores independentes devem se estimular porque por meio de co-produção nós estimulamos a compra e a produção de vídeos que sejam produzidos na América Latina e acabar com esse bloqueio que é o domínio total do audiovisual norte-americano sobre esses países. Fale mais sobre o jornalismo da Telesur? Beto Almeida - O jornalismo tem um peso forte porque nós sabemos que isso é determinante. Se nós quisermos ser uma alternativa a CNN, por exemplo, quem não gostar da CNN pode ligar na Telesur. O nosso jornalismo é alimentado por meio das oito sucursais que nós temos no Brasil, na Argentina, no Uruguai, na Bolívia, na Colômbia, no México, nos Estados Unidos, em Cuba e na Venezuela. Os produtores independentes mandam muitos vídeos. Esses vídeos mostram fatos muito interessantes como os desaparecidos da Mercedes Benz na Argentina na época da ditadura, produzido por cineastas alemães e argentinos. Na sua avaliação, quais os principais problemas que impedem uma transmissão honesta das informações? Beto Almeida - O problema é o interesse econômico sobre a informação. A informação é um bem publico. Só uma empresa pública e a comunicação nas mãos do setor público é que pode dar mais pluralidade, mais diversidade e construir melhor essa meta. Desde que haja uma gestão democrática. Isso é uma condição. Se não houver uma gestão democrática isso pode não ser uma realidade. Veja o caso brasileiro, por exemplo. Não há queixas na campanha contra a baixaria na mídia, não há nenhuma queixa contra a TV pública do Brasil. As queixas são todas contra a TV privada e comercial. Porque a TV pública bem ou mal e mesmo com a falta de recursos e sucateada, tem uma programação muito mais decente, objetiva e muito mais ligada a Constituição. A TV comercial faz tudo ao contrário. Quem é que dificulta a livre informação.