Economistas sugerem intervenção do Estado brasileiro contra a crise

Choque entre opiniões de economistas sobre as ações de combate à crise no Brasil marca o painel da tarde desta quarta-feira em Curitiba
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10/12/2008 - 18:55
Editoria
O debate desta quarta-feira (10) do seminário internacional Crise – Rumos e Verdades demonstrou a certeza, inerente aos quatro participantes do painel “O Brasil e a Crise”, que a turbulência que afeta o sistema financeiro do mundo todo não é passageira e vai refletir no país ainda por muito tempo. O mediador do encontro, o jornalista César Benjamim, comparou a posição do Governo Federal em relação à crise a um “navio que ainda não ganhou velocidade de cruzeiro”. Segundo ele, este seminário deveria servir de alerta de que o tempo não é indiferente. Ele disse que a crise não vai esperar o tempo que se queira e neste cenário o comportamento errático é o pior que se pode ter. “Podemos ir para o pior cenário eventualmente sem ter capacidade de evitar o pior” disse. Benjamim sugeriu que o combate seja feito com mais agressividade, baseado em coerência e rapidez em todas as frentes. “É melhor estar preparado pelos piores cenários do que ser surpreendido por eles”, completou. João Sicsú, diretor de estudos Macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão vinculado ao Governo Federal, classificou tímida o conjunto de ações tomadas pelo Brasil até agora, mas justificou que essa timidez é histórica, principalmente em relação a países como a Rússia e a Índia. “Toda a política macroeconômica e microeconômica adotada por esses países sempre foi muito mais sofisticada do ponto de vista da busca do crescimento”, afirmou. O diretor disse acreditar que o crescimento do Brasil nos últimos dois anos não tem relação com uma onda mundial, já que a maioria dos países registrou uma desaceleração neste período. “A economia brasileira depende muito pouco de suas exportações para explicar seu crescimento. Ela é uma economia fechada. O que explica o crescimento no país é o consumo interno e os investimentos”, explicou. Sicsú listou o aumento do salário-mínimo e o crescimento de concessão de crédito e uma política fiscal expansionista, expressa pelo Plano de Aceleração de Crescimento (PAC) aplicado pelo Governo Federal em setores estratégicos, mudança na arrecadação tributária e a formação de volume de reservas. “Associado a isto uma redução da taxa de juros que se encontra a um patamar mais baixo que em um passado recente”, disse. “O número de pessoas empregadas, com seguro-desemprego, garante os gastos no que pode ser o período crítico da crise”, explicou. “Nós temos que conjugar medidas monetárias, fiscais e sociais, que tem velocidades muito diferentes. Por enquanto todas elas foram tímidas, mas os efeitos sobre o Brasil foram muito menores do que na Rússia e na Índia”, finalizou. O professor Wilson Cano, doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas, cobrou aumento de gastos públicos nas áreas de ciência e tecnologia, aliadas a novas políticas industriais específicas de exportação para o desenvolvimento. Ele criticou o modelo neoliberal e sugeriu que se rompa com a forma como é feita a distribuição de crédito no país. “O crédito deve voltar a ser dirigido. A crise oferece oportunidades, janelas que criam graus de liberdades. Sair da crise significa sair do neoliberalismo e reassumir os controles sobre os mecanismos da política econômica. O modelo é incapaz de proporcionar média de crescimento médio e alto em longo prazo”, explicou. “Na questão habitacional, eu não daria dinheiro para construtoras, daria para as Cohabs que constroem casas para os pobres. O déficit habitacional brasileiro é formado por famílias que não ganham três salários-mínimos”, disse, para exemplificar a necessidade de créditos dirigidos. Para Cano, ao contrário do que acredita João Sicsú, a economia brasileira é extremamente aberta e dependente do dólar, o que justifica as elevadas taxas de juros. “Ousadia de política o Brasil teve entre 1930 e 1960, quando se controlou o câmbio e onze taxas de câmbio ao mesmo tempo. Eu hoje não vejo ousadia, vejo timidez”, afirmou. O professor Reinaldo Gonçalves, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), acredita que o Governo Federal não está enfrentando a crise apenas com timidez. Ele criticou as medidas que vem sendo tomadas em relação à política financeira, como as taxas muito altas de juros. Para o professor, o Brasil está se posicionando no cenário de crise com covardia. “A taxa de juros baixou no mundo todo e aumentou na fonte no Brasil. O Spread foi de 300 para quase 600 pontos. Além da covardia e incompetência, há políticas contrárias ao que um protocolo internacional de enfrentamento de crises recomenda”, afirmou. Gonçalves comparou a segurança do Brasil em cenários de crise a uma “blindagem de papel crepom”. “Temos uma economia altamente dependente do resto do mundo. As exportações correspondem a 45,3% do PIB brasileiro. Nossas reservas são pequenas. O problema é que as exportações afetam o número de renda na economia. Neste trimestre é que as exportações deram contribuição zero para o crescimento do PIB. SE as exportações caírem para 20% o PIB cai”, explicou lembrando que o país não tem rede de proteção como grandes economias iguais a Alemã, que podem garantir seguros aos trabalhadores. “Dependemos mais dos americanos hoje do que dependíamos antes, por estarmos são atrelada ao México e a China”, disse. O presidente do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea), Márcio Pochman, credita a crise a um projeto neoliberal, originada pela falta de uma regulamentação, principalmente nos Estados Unidos. Por isso, explica, não acredita que o Brasil vá sofrer os efeitos tão fortes como devem ser nos países desenvolvidos. “Se o Brasil tivesse um governo que desse vazão a esse modelo de forma mais evidente, nós estaríamos muito pior do que estamos hoje”, disse. Segundo Márcio, a experiência brasileira demonstra gastos altos do Governo Federal com o social, direcionado principalmente para os mais pobres. Ele usou o Bolsa Família para exemplificar um maior contingente da população beneficiada. “Gastamos somas fantásticas com pagamentos de juros para pouquíssimas famílias. O Governo Lula é um governo de programas, não um governo de reformas”, disse. “Ao meu modo de ver a crise não vai permitir remendos. Vamos ter que fazer opções, medidas mais drásticas e mais ousadas”, finalizou.

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