Economista da UFRJ diz que Brasil precisa de políticas estruturantes para enfrentar crise

Reinaldo Gonçalves participou nesta sexta-feira (5) do seminário “Crise – Desafios e Estratégias”, promovido pelo Governo do Paraná no Canal da Música, em Curitiba
Publicação
05/06/2009 - 19:20
Editoria
O Brasil não tem políticas estruturantes para enfrentar a crise, ao contrário do resto do mundo, disse o professor de Economia Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pós-doutor em Economia pela University of Reading (Inglaterra) Reinaldo Gonçalves. Ele participou nesta sexta-feira (5) do seminário “Crise – Desafios e Estratégias”, promovido pelo Governo do Paraná no Canal da Música, em Curitiba. Para Gonçalves, o governo federal tem adotado o que ele chama de “linha de menor resistência”, com políticas de afrouxamento de liquidez e políticas fiscais expansionistas. “Isso é o mais simples e o que todo o mundo está fazendo. O problema é que, quando o governo federal acerta, o faz em doses modestas, insuficientes. E as medidas (de apoio) são dirigidas aos setores dominantes: o agronegócio, as empreiteiras e os bancos. Nada tem sido feito para a garantia de emprego e renda do trabalhador, por exemplo”, criticou. Segundo Gonçalves, o Brasil possui uma economia desregulamentada, marcada pelos processos de privatização e pela flexibilização do mercado, que caracterizam o que ele chama de “modelo neoliberal periférico, de terceira categoria”, deixando o País cada vez mais vulnerável. “Essa liberalização na esfera comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira vem desde os anos 1990, agravada no governo de Fernando Henrique e aprofundada pelo governo Lula”, afirmou. “Não há nada para parar a liberalização, a desregulamentação e a privatização. Há ausência de diretrizes e estratégias do país. Não se pensa o país para frente”, disse. Gonçalves acredita que o Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC) tem reflexos insignificantes no enfrentamento da crise e não irá impedir a desaceleração do crescimento. “Os investimentos do PAC equivalem a 1,1% do PIB brasileiro, e foram projetados sob um crescimento nacional esperado em 5,5%. Teremos, no período do PAC, 2,9% de crescimento. Ao invés de termos aceleração, teremos uma desaceleração de crescimento”, disse. Em relação ao BNDES, o economista afirmou que os grandes projetos estão focados em commodities, reforçando a vulnerabilidade externa brasileira, o modelo periférico e a reprimarização das exportações. “No mercado de commodities, quando o ciclo econômico sobe, este mercado sobe, mas quando cai, ele despenca. Então, quando os preços mundiais de manufaturados caírem 1%, os de commodities cairão 27%. Sendo assim, os projetos são cancelados. É isso o que está acontecendo no Brasil, formando uma logística ineficiente.” Além disso, o preço das commodities está caindo 28% e reflete nos estados dependentes da exportação destes produtos, como os do Norte e Nordeste brasileiros, conforme destacou Gonçalves. “Sendo assim, cai a renda, a produção e o consumo. O mercado interno também é dependente do que acontece lá fora”. Para Gonçalves, as reservas brasileiras monetárias de US$ 180 bilhões Gonçalves são uma “blindagem de papel crepon”. Segundo ele, o último dado do Banco Central do Brasil mostra que o País tem um passivo externo de US$ 1,6 trilhão, sendo que um terço é de investimento externo direto, um terço de investimento externo indireto e o restante são dívidas. “Isso significa que, se olharmos só a curto prazo, o ativo dá mais de US$ 500 bilhões. Portanto, reserva não segura nada. Isso pode ser comprovado pelo fato de que o Brasil foi o país que teve a a maior desvalorização cambial do mundo, de 1,54 para 2,58, e uma das maiores volatilidades do câmbio”, avaliou. PROJEÇÃO – Gonçalves acredita que “o Brasil tem desempenho medíocre desde os anos 1980”. “Enquanto a economia mundial registra crescimento entre 2003 e 2007, a brasileira subiu menos. E, quando a economia mundial encolhe, a brasileira cai ainda mais”, disse. O economista lembrou que, no primeiro mandato de Lula, a taxa de crescimento médio anual ficou em 3,9% - nos países em desenvolvimento, foi de 6,6%. No segundo mandato, a taxa de crescimento médio anual do PIB será de 2,9%, “abaixo da média de crescimento da economia brasileira desde 1989, que é de 4,4%”. Ainda de acordo com dados apresentados pelo economista, o FMI prevê crescimento do negativo para o Brasil em 2009 - 1,3% negativo, sendo que os países em desenvolvimento devem crescer 1,6%. Em 2010, a previsão é que o Brasil cresça 2% e os países emergentes, 4%. “Ficaremos piores do que eles. Esta é uma previsão otimista e, mesmo assim, os resultados são medíocres”, disse. Diante deste cenário, Gonlçalves apontou algumas das ideias defendidas quando a crise começou e que caíram por terra. “Se falava que o Brasil dependia menos dos EUA e, portanto, quando a locomotiva descarrilasse, estaríamos protegidos. O argumento é que nossas exportações para os EUA representavam 22% da receita de exportação, e agora são 15%. Erro absoluto, porque ficamos menos dependentes deles, mas mais da China”, disse. Para Gonçalves, depender da China é pior que depender dos EUA, pois os asiáticos compram basicamente commodities brasileiras, enquanto os norte-americanos importam manufaturados e semi-manufaturados, intensivos em mão de obra e capital. Outro ponto é referente ao mercado interno brasileiro. Ele afirma que o alto grau de internacionalização das empresas representa um grave problema, porque faz parte de uma cadeia de distribuição de produção, com empresas filiais de empresas internacionais. “Quando há problemas na matriz, ela reconfigura suas estratégias globais e isso certamente traz impacto para as subsidiárias. Portanto, há impacto na renda, no emprego e no consumo. O argumento da robustez do mercado interno independente da conjuntura internacional não se sustenta em função dessa vulnerabilidade da economia brasileira”, afirmou. Reinaldo Gonçalves participou da mesa “Impactos da Crise no Brasil”, no seminário \\\"Crise – Desafios e Estratégias”, promovido pelo Governo do Paraná, no Canal da Música, em Curitiba. Gonçalves é professor titular de Economia Internacional do Instituto de Economia da UFRJ desde 1993. É livre docente em Economia Internacional também pela UFRJ (1991), tem mestrado em Economia pela Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV, 1976), e em Engenharia da Produção pelo Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação (1974), da UFRJ, além de ser bacharel em Economia pela UFRJ (1973).

GALERIA DE IMAGENS