O economista Marcio Henrique Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, vê um quadro sombrio que pode surgir dessa crise econômico-financeira mundial. Pior do que a depressão, o economista alerta para o surgimento de uma solução que pode levar à barbárie no mundo, em substituição ao sistema econômico-financeiro atual.
Castro foi um dos palestrantes do seminário Crise - Rumos e Verdades, que nesta terça-feira (9) analisou o tema “Crise e Poder Mundial”, no painel realizado pela manhã. O economista alertou que ao contrário do que se diz, a crise pode reforçar a hegemonia norte-americana, ao invés de enfraquecê-la.
O economista analisou os rearranjos políticos e econômicos que vêm acontecendo desde 1929/30, seguidos da Segunda Guerra Mundial para justificar sua projeção de que uma crise dessas proporções certamente levará a grandes mudanças no poder mundial, embora isso possa não ser a queda da hegemonia norte-americana.
Segundo Castro, enquanto os Estados Unidos demonstravam que tinham os mesmos interesses dos países aliados, criou-se uma situação de benevolência e ajuda que culminou com o Plano Marshall. Quando os aliados começaram a perceber que os interesses norte-americanos não eram os deles e alguns países, como a França, passaram a agir de forma autônoma, a reação norte-americana foi o rompimento unilateral do sistema de cooperação. “Essa estratégia, ocorrida em 1971, foi a demonstração clara de uma situação de força, embora naquela época não foi vista assim”, mostrou o economista.
Na verdade, os Estados Unidos utilizaram essa conjuntura para fortalecer sua moeda. A partir de 1971, foi criado um sistema financeiro onde o dólar passou a ser o principal instrumento de troca no cenário mundial. “Portanto, a crise de 1971 não foi o desastre da hegemonia americana. Pelo contrário, essa hegemonia foi reforçada”, declarou.
Ainda para justificar essa posição, Castro citou outras crises fabricadas para fortalecer a hegemonia americana, como a que foi provocada no Chile para derrubar Salvador Allende. Lembrou da derrubada da União Soviética e vitória norte-americana na Guerra Fria, quando os Estados Unidos utilizaram a derrubada dos preços dos petróleo para desestruturar o orçamento soviético. Lembrou ainda das investidas de Bin Laden no Afeganistão, na época patrocinado pelos Estados Unidos, também para desestruturar a URSS.
Também foi a partir das décadas de 60 e 70 que os Estados Unidos utilizaram o neoliberalismo e seu poderio econômico-militar para instituir e fortalecer sua política monetária. Segundo o economista, os EUA usaram e abusaram do sistema de financiamento em todo o mundo a partir de sua moeda.
O que aconteceu depois da vitória norte-americana na Guerra Fria foi que tudo ficou muito solto com o neoliberalismo, disse Castro. Foi quando foram promovidas situações como dolarização, desestatização e desregulamentação. Isso enfraqueceu os países mundo afora, só liberando espaço para o capital e sua acumulação. Acontece que esse cenário sem regulamentação também afetou os Estados Unidos.
Foi quando o complexo industrial-militar conseguiu se apropriar de grande parte do maior fluxo de dinheiro americano, que é o orçamento.Estima-se que 40% do orçamento norte-americano são absorvidos por esse complexo.
Para o momento atual, Castro diz que o quadro é sombrio, mas não arrisca afirmar que a tendência é de desastre para a economia americana. “Para muitos, está sinalizando isso”, disse. Mas na sua avaliação, essa crise econômico-financeira não quer dizer que vai enfraquecer a hegemonia americana. Pelo contrário, ela pode até fortalecê-la. “Essa crise pode ser o instrumento de administração do poder mundial americano”, alertou.
Para reforçar essa tese, Castro lembrou que essa crise está atingindo o mundo no momento em que os países enfrentam grandes questões, como a preservação do meio ambiente, o déficit de energia e a sobrevivência das instituições republicanas, situações que impedem soluções simples. Portanto, essa crise financeira, atinge os países enfraquecidos e não há consenso social e político para tomada de decisões.
Na visão do economista, o estabelecimento desse cenário aliado ao poderio do complexo militar norte-americano, que ganha autonomia ao se apropriar do dinheiro público, aponta para um futuro cinzento e a uma solução que leva à barbárie, sintetizou.