Data: 16/01/2007 - “Aos Paranaenses” - Artigo assinado por Nivaldo Kruger, fundador do MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e ex-presidente do Diretório Regional do PMDB do Paraná

Artigo assinado por Nivaldo Kruger, fundador do MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e ex-presidente do Diretório Regional do PMDB do Paraná
Publicação
16/01/2007 - 17:03
Editoria
“Nenhuma pessoa de esquerda pode deixar de admitir que a esquerda de hoje não é mais a de ontem. Mas enquanto existirem homens cujo empenho político seja movido por um profundo sentimento de insatisfação e de sofrimento perante as iniqüidades das sociedades contemporâneas, eles carregarão consigo os ideais que há mais de um século tem distinguido todas as esquerdas da História”. (Norberto Bobbio). Nivaldo Kruger As mensagens do governador Roberto Requião no discurso de posse de 1º de janeiro de 2007, com voz firme de comando, apontou o rumo, demarcou o território com divisas claras. Ouvi suas palavras, inquietei-me e não contive o ímpeto de me manifestar. O inimigo ocupa o território da direita, e a nós cabe o campo da esquerda. É uma necessária distinção de concepções, de modos de agir, que a balbúrdia partidária misturou, desfigurando as identidades e confundindo as fisionomias, no roldão das pressões e das intrigas. Os adversários não combatiam a nossa causa. Eles simplesmente não tinham o que combater, e em conseqüência não sabiam como fazê-lo. Por isso, o governo não foi discutido, o governador é que foi agredido, insultado, com a intenção de destruir sua reputação pessoal. O que existiu foi um complô interesseiro daqueles cujos negócios privilegiados já haviam sido interrompidos pelos paranaenses, com a eleição do governador em 2002. Não perceberam, os adversários, que o silêncio sobre sua honestidade foi o maior elogio. A eloqüência desse silêncio agora, e só agora, ressalta. Mesmo assim, a vitória se consumou, porque “Este país com sua instituição pertence ao povo, que nele mora. Quando estiver cansado do governo existente deve poder sempre exercer o seu direito constitucional de censurá-lo ou o seu direito revolucionário de derrubá-lo”. (Abraham Lincoln). Conciliação Conciliar o quê? Com quem? As coisas de gênero oposto podem até misturar-se por circunstâncias momentâneas, mas conciliar-se nunca. Porque o abraço dos opostos na cúpula desacredita, e com razão decepciona os militantes autênticos das bases. Cristo nos deu o exemplo, quando não conciliou com os vendilhões do templo, colocando-os no seu devido lugar, para exercerem seu merecimento fora, do outro lado. “Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou há de odiar a um e amar a outro, ou há de dedicar-se a um e desprezar o outro. Não podeis servir a Deus a Mamon”. (Mt) É preciso resistir à tentação das promessas convenientes. Também aí temos o exemplo bíblico. À proposta de Satanás. “Tudo isto te darei se prostrado me adorares”, Cristo responde, sem pestanejar: “Retira-te, Satanás!” (Mt. 4.10). Esquerda Ao confirmar o lado, o governador teve a lucidez de salvaguardar sua identidade ideológica: “A minha esquerda, entretanto, não é a esquerda marxista”. Portanto, desvinculada do esquerdismo socialista histórico, do socialismo de Estado. “Minha posição inspira-se nos princípios da Carta de Puebla”, que não é outra coisa senão sua opção pela liberdade, pelo respeito e dignidade da pessoa humana, com uma claríssima definição de política social – contrária ao materialismo tanto socialista como capitalista, por serem ambos, como condena a Carta de Puebla, materialistas. E que, por isso, acabaram qualificados como sistemas injustos de dominação e de força, anticristãos. “Se uma sociedade livre não puder auxiliar os muitos que são pobres, não pode salvar os poucos que são ricos”. (J.F.Kennedy). As palavras de Kennedy sintetizam magnificamente as do governador. “Nos próximos quatro anos vamos radicalizar essa opção. Vamos ainda mais a fundo na tarefa de governar para o povo. E não é um governo de centro-esquerda, não. Não venham com esses centrismos, esses equilibrismo. Somos sim um governo de esquerda. E que não há mais interpretação ou distorção daquilo que disse o presidente Lula não servia de pretexto para que alguns neguem o lado em que nos posicionamos. (Radicalizar – comportamento dos que visam combater pela raiz as anomalias sociais – Aurélio). “Somos de esquerda, porque ser de esquerda é ser solidário, fraterno, humano. É ser gente. É ter olhos, a alma e o coração voltados para as desigualdades e as misérias deste mundo”. Nesse contexto, deve ser enfatizada, entre outras, a luta do governador contra o absurdo do monopólio das sementes, uma das formas como o sistema globalizante afronta a soberania dos povos. É preciso, também, que fique bem claro que a menção a Hugo Chávez, Evo Moralez e Rafael Correa não significa, como alguns maliciosamente propalam, adesão ou subordinação à filosofia e às formas de governar daqueles estadistas. A identidade, evidentemente, coincide apenas no que tange à rejeição aos liames dominantes do neoliberalismo, restrita a questões específicas e localizadas, que só a nós dizem respeito. Verbera com firmeza o governador sobre os abusos das redes nacionais de comunicação: “que manipulam 667 veículos – emissoras de TV, rádios e jornais diários, atingindo 87% dos domicílios brasileiros. Há ainda quem ouse dizer que isso não é monopólio da informação, que isso não é controle de opinião pública, que isso não é uma verdadeira ditadura do pensamento dominante. É salutar que o poder da grande mídia comece a ser colocado em xeque, e que sua credibilidade como agente formador de opinião pública seja questionado”. E prossegue no discurso enumerando os tópicos do ideal “de uma comunicação de interesse público, que estimule o debate. Que tenha compromisso com a formação, a educação e a construção da cidadania. Nós teremos, enfim, uma comunicação popular, onde mil flores desabrochem e mil correntes de pensamentos se rivalizem”. Isto equivale a dizer: nós queremos o livre confronto das idéias, a democracia. O discurso atenta em síntese para as novas realidades, aglomerados urbanos gigantescos: desequilíbrios econômicos; exclusão e marginalização social. Educação, saúde, direitos humanos, justiça social, relação Estado sociedade e soberania nacional. Decomposição dos ecossistemas. Água-solo-ar, a vida. Autonomia e relação entre os entes federados. O homem e a nacionalidade. A decomposição dos costumes e valores. A influência da mídia. A globalização e sua influência sobre o Estado-nação. O discurso aborda nos limites da síntese a amplitude das questões a serem enfrentadas e que formam grandes conexões, muitas vezes ocultas, dentre os fatores desta grande teia, encerra-se também o grande desafio. O governador foi claro, “o meu lado é o do povo, a minha opção é pelos pobres”. Assim, o governador, depois de identificar claramente os lados, definiu onde está o nosso. Com voz firme, mas com ternura, perorou dizendo que sua esquerda é a do lado do coração. Concluindo, renovou seus compromissos, e dirigindo-se à esposa e aos filhos presentes, significando simbolicamente dirigir-se a toda família paranaense. “Incluam-me em suas orações, peçam a Deus por mim, para que Ele me ilumine e me faça firme e corajoso na defesa dos interesses do nosso Povo”. Com esse terno e fervoroso pedido, que encerra a grandeza da humildade perante o Criador, finalizou sua mensagem. Esta peroração tem na História um similar. Quando Rui Barbosa aceitou a importante missão de defender o Brasil em Haia, escreveu ao Padre Yabar, rogando orações: “Sempre que puder implore por mim o auxílio de Deus, que tanto necessito nos trabalhos da minha vida e, especialmente agora, entre as dificuldades desta missão”. (Voltou de Haia vitorioso). Certamente, governador Requião, não lhe faltarão as orações dos seus familiares e nem da grande família paranaense, para que não esmoreça diante das dificuldades de sua árdua missão. (Hás também de voltar vitorioso). Nivaldo Kruger é fundador do MDB (Movimento Democrático Brasileiro) e ex-presidente do Diretório Regional do PMDB do Paraná