A crise que atingiu a economia mundial pode evoluir, em pouco tempo, de recessão para depressão. A análise foi feita por Nildo Ouriques, economista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), durante a manhã do primeiro dia de debates do seminário internacional “Crise – Rumos e Verdades”, realizado em Curitiba pelo Governo do Paraná.
Aspectos como o grande endividamento na economia americana, que afeta empresas, famílias, municípios e Estados; o colapso do sistema de crédito, com a dificuldade dos bancos de se recapitalizarem mesmo com a ajuda dos Governos e o risco de falência de grandes empresas como a Ford e General Motors foram apresentados e detalhados pelo economista para justificar a afirmação de que a crise deve ter reflexos ainda mais acentuados.
“São diversos fatores que indicam que temos a possibilidade de não estarmos entrando em um período de crise, mas em uma profunda depressão com reflexos para todos os mercados, sejam centrais ou dependentes”, afirmou o professor, que também é responsável pelo centro de Estudos Latino-Americanos da UFSC.
Ouriques apontou a queda de preços do petróleo - o barril caiu de 140 para 40 dólares nas últimas semanas - e o aumento do desemprego dos Estados Unidos como outros indicativos da seriedade da crise. “Não há mais dúvida de que a crise tocou fundo no setor real da economia”, disse.
A recessão é uma queda aguda do Produto Interno Bruto (PIB) por dois ou mais trimestres consecutivos. Já a depressão está relacionada com outros aspectos mais amplos, como níveis de emprego, produção industrial, rendimento real e crédito disponível.
PREVISÍVEL – Segundo o professor da UFSC a crise era previsível, ao contrário do que muitos governantes e setores da imprensa têm divulgado. Ele citou dois economistas chilenos, que em momentos distintos alertaram que a economia americana estava caminhando para um colapso. Orlando Caputo e José Carlos Feijó publicaram livros e estudos alertando para a crise. “Eles se basearam em dados eloqüentes, contudo seus estudos não circularam na época e tampouco foram debatidos”, afirmou.
Entre os indicativos de dificuldades estava a grande diferença entre a evolução dos preços das ações em comparação aos lucros das empresas, que iniciou-se ainda em 1993. “Em alguns períodos as ações cresciam acima de 100%, enquanto que os lucros não superavam a casa de 20%. Era a comprovação da existência de uma bolha especulativa muito clara que se acentuou a partir de 2000 e 2001 nos Estados Unidos”, ressaltou Ouriques.
OPORTUNIDADE - Contudo, a crise é uma oportunidade que os “governos não podem desperdiçar”, diz Ouriques. Uma chance romper consensos e pensamentos que vêm doutrinando a economia mundial há mais de duas décadas. “É hora da política, hora de pensar aquilo que não foi pensado nos últimos 25 anos. É o momento de romper essa amnésia social, esse controle das idéias que caracterizou a vida brasileira, a vida latino-americana e a vida mundial”, disse.
Citando diversas vezes os economistas e pensadores Karl Marx e John M. Keynes, o economista da UFSC criticou o consenso de ideologia que doutrina a economia mundial há duas décadas e que dificulta o debate e o surgimento de idéias para vencer a crise. “Temos que sair de uma consciência ingênua para uma consciência crítica. Debater alternativas para superar a crise e fortalecer as economias”, finalizou.