Copel aponta todas as etapas para compra de termelétrica

Desde a constituição da UEG Araucária, em 1988, até a aprovação da compra das ações majoritária da norte americana El Paso nesta segunda-feira (22)
Publicação
22/05/2006 - 19:26
Editoria
A empresa UEG Araucária Ltda foi constituída em 28 de abril de 1998, com participação acionária da El Paso (60%), Copel (20%) e Petrobras (20%). Em 31 de maio de 2000, a Copel assinou com a UEG Araucária um contrato de compra e venda de potência assegurada (PPA) com duração de 20 anos, pelo qual a Copel garantia exclusividade na aquisição de toda energia produzida pelos 484 megawatts de potência da usina – energia suficiente ao atendimento do consumo de 1,5 milhão de pessoas. Esse contrato, com cláusula “take or pay” (pague mesmo que não use), também previa que a responsabilidade por todos os custos de manutenção e operação da Usina competiriam à Copel, bem como o fornecimento de insumos (água, combustível, mão de obra e manutenção, entre outros). O suprimento de gás natural, fornecido pela Petrobras, foi contratado com a Compagas e continha, igualmente, cláusula “take or pay”. Cara e desnecessária Por prever índices de correção de preço não reconhecidos pela Aneel (variação cambial, por exemplo), o PPA entre UEG Araucária e Copel nunca foi homologado pela Agência, impedindo que qualquer despesa ou pagamento dele decorrente fosse incorporado ou gerasse reflexos na estrutura de custos da estatal. Isso quer dizer que a tarifa autorizada para a Copel jamais consideraria a compra da energia que viesse a ser produzida pela UEG Araucária – mesmo que a usina produzisse energia. Ainda dentro da hipótese de a Usina de Araucária poder produzir energia, seu custo inviabilizava sua colocação no mercado – à época com grandes sobras por causa da redução do consumo, conseqüência do racionamento que vigorou por um ano em quase todo o Brasil (com exceção dos estados do Sul). Ou seja, a energia de Araucária, além de cara, era totalmente desnecessária. Incompatibilidade Durante a construção da usina, foi detectada uma incompatibilidade entre o combustível a ser consumido e as turbinas instaladas, o que levou a fornecedora a retirar a garantia de fábrica que cobria os equipamentos. Esse fato levou os dirigentes do empreendimento a construir uma unidade para processar o gás natural de forma a compatibilizá-lo às especificações definidas pelo fabricante. Foram investidos US$ 43 milhões nessa instalação adicional – que mais tarde revelou ser dispensável: um termo de especificação técnica emitido posteriormente pelo fabricante reconheceu que as turbinas poderiam funcionar perfeitamente com o gás que estava disponível. A Usina foi dada por concluída e solenemente inaugurada em 30 de setembro de 2002, depois de operar no modo “manual”, de forma precária e assistida por 100 horas a título de teste. Ela jamais operou em regime comercial de produção. Corte de Paris Entre os meses de outubro e dezembro de 2002, a Copel efetuou pagamentos mensais à UEG Araucária da ordem de R$ 25 milhões pela potência objeto do PPA. Tais repasses foram suspensos em janeiro de 2003 por orientação do governador Roberto Requião, que determinou à Copel providências para a renegociação do contrato – lesivo ao interesse público e altamente prejudicial ao equilíbrio econômico e financeiro da própria Copel. Algumas reuniões chegaram a acontecer, mas em abril de 2003 a UEG Araucária Ltda. considerou rescindido o contrato de PPA e ingressou com pedido de arbitragem na Câmara de Comércio Internacional de Paris, requerendo que a Copel fosse condenada a adquirir a propriedade da Usina mediante o pagamento de US$ 827,5 milhões. Instaurado o litígio, a Copel ingressou no Judiciário brasileiro com ação declaratória de nulidade da cláusula arbitral e medida cautelar de produção antecipada de provas. Inoperante A Usina Elétrica a Gás de Araucária é um empreendimento que consumiu investimentos superiores a US$ 300 milhões sem jamais haver operado comercialmente em razão de inadequações de projeto, desajustes técnicos, inconformidades com os padrões do Sistema Elétrico Interligado Nacional e também por questões de segurança. Tudo isso foi constatado e está atestado em laudos periciais isentos, elaborados por instituições e profissionais de renome do Brasil, de Portugal e da Inglaterra, realizados no âmbito da medida cautelar de produção antecipada de provas instaurada pela Copel. Gasto por nada Se a Copel tivesse mantido os pagamentos mensais à UEG Araucária nos termos do contrato original, ela teria desembolsado R$ 844 milhões entre janeiro de 2003 e dezembro de 2005 sem agregar nada ao seu patrimônio. Considerando-se nessa conta as faturas pelo suprimento de gás natural (também um contrato do gênero “take or pay”), esse gasto subiria à casa de R$ 1,5 bilhão. Ao longo dos 20 anos de vigência, o cumprimento do contrato PPA com a UEG Araucária significaria, a preços do ano 2000, desembolso total de R$ 3,4 bilhões. Trazido a valores presentes, essa despesa chegaria à casa dos R$ 5 bilhões. O acordo com a El Paso A Carta de Intenções assinada em 17 de fevereiro de 2006 com a El Paso estabelece critérios para uma solução definitiva ao caso envolvendo a Usina a Gás de Araucária: a Copel adquire os 60% das ações da El Paso na UEG Araucária pelo equivalente a US$ 190 milhões e eleva sua participação na sociedade para 80%. A Petrobras permanece com seus 20%, já tendo formalizado sua concordância com a negociação. Os US$ 190 milhões da compra a parte da El Paso representa 48% do que a Copel teria gasto até o final do ano passado cumprindo o PPA, sem contar com a despesa do gás: um dinheiro gasto sem se tornar dona de nada. Essa importância também é inferior aos aportes feitos pela própria El Paso no empreendimento, convertidos em dólares ao câmbio atual (cerca de US$ 202,6 milhões). A transferência do controle acionário da UEG Araucária para a Copel já tem a aprovação da Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica, que apreciou a operação em reunião de diretoria no dia 16 de maio. O acordo com a Petrobras A conta de suprimento do gás, outro passivo associado ao empreendimento, foi definitivamente solucionada num acordo firmado entre Copel e Petrobras no dia 6 de março. A Copel reconheceu uma dívida com a Petrobras de R$ 150 milhões e vai pagar essa quantia em 60 parcelas a partir de janeiro de 2010. A soma das faturas não pagas pelo gás chegava, em valores atualizados, a R$ 750 milhões. Na mesma data, a Petrobras assegurou por escrito à Copel que envidará seus melhores esforços para garantir o abastecimento da usina a partir de 2010 com gás natural ou outro combustível, viabilizando seu funcionamento. Em outro documento, a empresa manifestou não fazer objeções à compra pela Copel dos 60% de participação da El Paso no empreendimento. Fim ao risco e início de operação O término das discussões e a solução ao impasse judicial em torno da Usina de Araucária significará afastar definitivamente um risco empresarial de grande vulto à Copel e que vai se refletir na redução dos custos financeiros (“spread”) em eventuais operações de captação de recursos no mercado. O barateamento desses custos repercutirá positivamente nos programas de investimento da Copel, com benefícios aos consumidores. Incluída na mais recente revisão do Plano Decenal de Expansão do Setor Elétrico Brasileiro, finalizada em março, a Usina a Gás de Araucária tem início de operação previsto para dezembro de 2008, reforçando a oferta de energia na Região Sul do país. Isso vai ser possível com investimentos estimados pela Copel em R$ 11 milhões para que a Usina seja devidamente adequada e possa funcionar de modo contínuo, confiável e seguro. A um custo estimado entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões, a Copel também pretende flexibilizar as turbinas da Usina para que elas tenham condição de operar usando outro energético além do gás natural. O diesel, insumo com oferta suficiente no mercado brasileiro, seria uma das alternativas disponíveis.