Cohapar vai construir moradias em 21 comunidades quilombolas

O planejamento prevê a construção de 333 casas, escolas, acesso viário, esgoto e energia elétrica nas comunidades quilombolas de descendentes de escravos fugitivos da época da colonização do Brasil
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20/03/2009 - 14:50
Editoria
Uma ação integrada do Governo do Paraná, inédita no País, vai atender a 21 comunidades de descendentes de escravos que vivem nas regiões do Vale da Ribeira e dos Campos Gerais, com a construção de 333 casas. O planejamento inclui escolas, acesso viário, esgoto e energia elétrica . A Cohapar (Companhia de Habitação do Paraná) realiza em campo cadastramento das famílias para executar o planejamento habitacional nestas regiões. O investimento previsto é de R$ 7 milhões. O presidente da Cohapar, Rafael Greca, diz que este trabalho vai além do reconhecimento da importância histórica dessas comunidades. “O que queremos é realizar a promoção humana e social de uma população esquecida por mais de dois séculos. É como se o país ignorasse a própria história e isso precisa ser recuperado. Quando o governador Requião determina ações nesse sentido, significa um avanço do ponto de vista humano, histórico e social”. O projeto para as áreas dos quilombolas contempla ainda outras ações sociais, de saúde, assistência jurídica e acesso viário. Para isso o governo trabalhará em conjunto com o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), Ministério Público Estadual, Copel, e Sanepar. Na comunidade do Tatupeva, em Adrianópolis, a 30 quilômetros da cidade, onde moram seis famílias, Antônio Mariano dos Santos, conhecido como Tio Mineiro, 85 anos, conta que os pais descendentes de escravos vieram de um quilombo de Minas Gerais. “Segui o conselho de minha mãe que dizia para não casar enquanto não tivesse um pedaço de chão. Consegui a terra e só então casei. Aqui criei nove filhos e enterrei dois. A terra é o maior bem que alguém possui. Dela vem nosso alimento”, disse. Antônio Mariano dos Santos lembra das histórias contadas pelo seu pai, que ouviu do avô, sobre a vida dos escravos. “Naquele tempo, os escravos comiam num ‘coxo’, como fazemos com os animais hoje. Era um povo sofrido e, por isso, fugiam das fazendas formando os quilombos”, conta. O negro que era capturado pelos mandantes dos fazendeiros, conhecidos como “capitão do mato”, sofriam torturas brutais. “Muitos não aguentavam e morriam. Eles amarravam o negro na roda d’água, e dali o pobre não saia mais”, conta Antônio. Antônio mora numa casa de madeira, com luz e água encanada da mina, mas durante quase toda vida viveu em casas de barro. Foram construídas cinco no total. Uma delas virou um paiol, onde guarda os produtos da roça. Numa casa pequena ao lado de onde mora, vivem a nora, Silene Gelinski, descendente de poloneses, casada com o filho Ademir Mariano dos Santos. Ambos cuidam de Tio Mineiro e do filho excepcional de 44 anos. No Vale do Ribeira, município de Adrianópolis, onde a Cohapar mapeia 13 comunidades de quilombolas, muitas famílias ainda moram em casas de pau a pique feitas com barro, tetos de palha de sapé e divisórias em bambu. Outras são totalmente construídas com bambu. Todos sobrevivem da lavoura, que mantem para o consumo familiar, e criação de pequenos animais. As comunidades ficam em locais de difícil acesso, entre as montanhas do Vale da Ribeira, com acesso por estradas de terra precárias, onde os carros podem passar se não chover. “Antigamente, passar por aqui não era possível”, lembra um dos moradores mais antigos da comunidade do Córrego das Moças, Antônio Ferreira e Pontes, de 65 anos. “Aos poucos as melhorias foram chegando. Hoje em muitas casas tem até luz”, conta. Ele e a esposa Maria Rosa Chanda Pontes criaram 10 filhos num barraco feito de bambu, piso de chão batido, com pouco espaço interno, sem banheiro e fogão à lenha, feito em barro. Na terra planta-se feijão, milho, mandioca e café, que é de onde tiram a comida do dia a dia. Hoje Antônio é aposentado como trabalhador rural, atividade de onde herdou problemas crônicos na coluna . “Tudo que mais quero na vida é morar numa casa assim. Ter um banheiro, luz, tudo bem arrumado. Se isso acontecer mesmo, vai ser a coisa mais maravilhosa da minha vida. Rezo para que isso aconteça”, diz Maria Rosa, mulher de Antônio.

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