Cientista político afirma que crise nasceu do modelo de bancos centrais

Lorenzo Carrasco propôs retorno do crédito primário às mãos dos governos como uma das soluções para crise do sistema econômico
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09/12/2008 - 14:41
Editoria
O jornalista, sociólogo e cientista político mexicano Lorenzo Carrasco, afirmou durante sua apresentação, nesta terça-feira (9), no seminário internacional Crise - Rumos e Verdades, que a convulsão financeira atual decorre do próprio modelo de bancos centrais, especialmente a partir da criação, em 1913, do Federal Reserve System, nos Estados Unidos. “Todo sistema de bancos centrais fracassou, aí está o problema. Com as mudanças geopolíticas que virão, quem vai continuar a conduzir o crédito na organização mundial, serão os mesmos?”, questionou. Carrasco sugeriu que os Estados resgatem do sistema bancário privado a prerrogativa de emissão primária de crédito, para fomentar a geração de empregos e ativar a economia. Nessa situação, o sociólogo imagina que a maioria dos contratos de derivativos deveriam ser cancelados e tornados ilegais. Derivativos são instrumentos financeiros, derivados de um ativo real. Há hoje derivativos de ativos como ações, commodities (produtos agrícolas, minerais etc.), câmbio, juros e mais uma série de instrumentos mais “sofisticados” criados pelo mercado. Assim, se definem pagamentos futuros baseados no comportamento dos preços de um ativo de grande negociação no mercado. A essência dos derivativos consiste na fixação do valor futuro dos ativos em uma determinada negociação e sua finalidade inicial é a de ser uma ferramenta de hedge tanto para quem está comprando, como para quem está vendendo, de acordo com o caso. Um produtor de soja quando vai iniciar seu plantio não sabe em que patamar de preço estará o produto na época da colheita, muitas vezes o preço da soja cai nesse período e o valor auferido com a venda da colheita é até insuficiente para cobrir seus custos. Carrasco resgatou as idéias do francês Jean-Baptiste Colbert (1619-1683), como exemplo de contraposição ao sistema de crédito baseado na iniciativa privada. “Ele defendia que o regime de crédito deve ser a função principal do Estado. Isso não é marxismo, é justamente a resposta a uma sociedade hegemônica de cunho colonialista”, afirmou. A ruptura dos acordos de Bretton Woods, em 1971, que levaram à desregulamentação do sistema financeiro internacional e seu crescente descolamento dos setores produtivos, agravou os problemas econômicos. “O que estamos vendo é uma sucessão de bolhas financeiras - dos petrodólares, dívida externa, junk bonds, imóveis (Japão), internet, imóveis (subprime-EUA) e a mãe de todas as bolhas, os derivativos”, lembrou. Como resposta a esse processo, o sociólogo propôs, concretamente, a centralização do câmbio, controle do fluxo de capitais e a proteção das cadeias produtivas nacionais essenciais para o consumo, o emprego e a produção. ESTADOS UNIDOS - Carrasco analisou a história do papel dos Estados Unidos na organização mundial. “É preciso lembrar que os americanos surgiram como nação com uma proposta industrializadora, que se contrapunha ao projeto colonial inglês. No entanto, a morte de Roosevelt, em 1945, abriu caminho para a Guerra Fria, que dividiu novamente o mundo em duas áreas de influência coloniais”, disse. Carrasco lembrou também que as idéias dos pais fundadores norte-americanos são atualmente eliminadas dos seus currículos escolares. Os Estados Unidos, segundo o mexicano, tentam manter sua hegemonia atual a partir de três frentes: poder militar, domínio das finanças internacionais e capacidade de moldagem do pensamento predominante entre a população. “No Afeganistão e no Iraque, os EUA estão vendo que está sendo impossível, pela força militar, impor sua vontade. A crise financeira nos mostra o colapso do segundo ponto, e também na capacidade de influência cultural estamos vendo diminuição da influência americana”, argumenta Carrasco. “A própria visão de homem, vigente na sociedade, é algo que tem profundas implicações no modo como nos organizamos. As pessoas não são mais cidadãos ou membros de nações, mas objetos de mercado. É incentivada a idéia da cobiça, cujo objetivo é o consumo” afirmou. Citando Santo Agostinho (354-430), Carrasco lembrou que os objetivos dos Estados devem ser opostos a essa visão. “Quando a sociedade não está orientada à justiça, ao bem-comum, quando os governos deixam o sentido da justiça, não passarão de um bando de ladrões”.

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