ANTT diz que Ferropar é incapaz de operar Ferroeste

Agência Nacional de Transportes Terrestres realizou uma inspeção na ferrovia que liga Cascavel e Guarapuava e concluiu que a concessionária está longe de atender a demanda
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19/04/2005 - 18:20
Editoria
A concessionária Ferropar - empresa responsável pela operacionalização e manutenção da Ferroeste - ferrovia que liga Cascavel a Guarapuava - é incapaz tecnicamente e operacionalmente de prestar serviço público de transportes ferroviário de cargas. A conclusão foi feita pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em relatório de inspeção técnico-operacional encaminhado a diretoria da Ferroeste. As análises dos técnicos da ANTT apontam que a Ferropar, que administra 248 km de ferrovias, utilizando exclusivamente sua frota, está transportando menos de 6% do volume total escoado pela ferrovia. No mês de março de 2005, por exemplo, das 105.548 toneladas transportadas pela via, a concessionária carregou somente 5.968 toneladas enquanto que a América Latina Logística (ALL), outras concessionária que atende o transporte ferroviário no Paraná, escoou 99.580 toneladas. “O relatório técnico demonstra e prova que a Ferropar não possui capacidade alguma de escoar a grande produção de que vem do Oeste do Paraná”, afirmou o governador Roberto Requião, ao explicar que o governo do Estado está estudando as medidas que irá tomar. Estudo - O relatório, elaborado entre 4 e 8 de abril deste ano, teve como objetivo verificar, principalmente, as condições da via permanente, da oficina de manutenção de material rodante (locomotivas e vagões) e dos terminais, tendo em vista o pleno atendimento dos usuários. Segundo o estudo da agência reguladora, a pouca capacidade da Ferropar em escoar a produção agrícola é causada pela falta de aquisição de frota de locomotivas e vagões por parte da empresa. Hoje, a Ferropar está muito longe de alcançar o número de locomotivas e vagões estipulados pelo edital de licitação. A empresa possui apenas 5 locomotivas, sendo que uma está parada no pátio de Guarapuava por problemas mecânicos, e 37 vagões operacionais. Porém, o edital definiu que, para atender a demanda da ferrovia, seria necessária a aquisição de 60 locomotivas e 732 vagões graneleiros. “Os reflexos da falta de material rodante da Ferropar ficam evidenciados quando verifica-se que a subconcessionária transportou, exclusivamente com sua frota, cerca de 6% das 105.548 toneladas transportadas em março de 2005”, aponta o relatório. “A empresa não está cumprindo com a sua finalidade. Desde o início do contrato de concessão, a Ferropar ficou sempre muito aquém das metas estipuladas”, completou o diretor-presidente Ferroeste, Martin Roeder. Manutenção – O relatório aponta também que a Ferropar mantém poucos funcionários para realizar a manutenção da via permanente. Segundo o levantamento da ANTT, a empresa possui apenas 2 turmas, no total de 17 empregados. “Este quantitativo é insuficiente para uma manutenção adequada”, conclui a agência. Outro ponto questionado é a falta de Aparelhos de Mudança de Via (AMV) elétricos ou de mola ao longo dos 248 km da ferrovia, o que acarreta a diminuição da velocidade dos trens comerciais e resulta no aumento do tempo da viagem, “com o agravante da Ferropar adotar o sistema de monocondução, o que obriga o maquinista a descer da locomotiva para operar os aparelhos de manobra”, destaca o levantamento. Ainda com relação a linha férrea, o relatório classifica medidas de manutenção da via como “canibalismo da via”. “Devido a um descarrilamento ocorrido em 2004, os dormentes de concreto danificados foram substituídos por dormentes de madeira retirados da linha de cruzamento, evidenciando canibalismo da via permanente”, apontou a ANTT. A substituição de dormentes pode ser observada também no ramal de calcário da empresa. No local, os técnicos verificaram a falta de diversos componentes metálicos e até dormentes especiais. “Provavelmente este material está sendo usado para a reposição de componentes danificados na linha principal da Ferropar”, aponta o estudo. Erosão – Os técnicos da Agência reforçaram as constatações feitas pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP), no início de março, com relação ao processo erosivo encontrado no pátio da empresa em Cascavel. “Constatou-se erosões de grandes proporções no pátio de Cascavel e que, apesar das notificações e multas aplicadas pelo Instituto Ambiental do Paraná, nenhuma providência foi tomada pela Ferropar para atender as notificações do IAP”, cita o relatório. Box: Histórico da privatização da Ferroeste A Ferroeste foi construída entre 1991 e 1994, durante a primeira gestão do governador Roberto Requião e contou com mão-de-obra de dois batalhões do Exército Brasileiro. A obra custou, na época, cerca de US$ 340 milhões – o equivalente a R$ 1 bilhão em valores atuais – e foi paga exclusivamente com recursos paranaenses. A Ferroeste foi a última e mais barata ferrovia já construída no país. Em 1996, a ferrovia foi leiloada pelo governo Jaime Lerner. O único interessado no negócio foi o grupo Ferropar, formado pela Gemon Geral de Engenharia e Montagens, FAO Empreendimentos e Participações Ltda., Pound S/A e América Latina Logística (ALL). Na época, o grupo ofereceu R$ 25,6 milhões pela ferrovia, o preço mínimo do leilão, e pagou R$ 1,2 milhão (5% do lance) à vista. A Ferropar ganhou três anos de carência para começar a quitar a dívida, que foi dividida em 108 parcelas trimestrais de pouco mais de R$ 1 milhão. O contrato tem validade por 30 anos A primeira venceria no dia 15 de janeiro de 2000 e as demais nos dias 15 de abril, de julho e outubro de cada ano, até 2026. Mas, em 31 de março de 2000, o consórcio avisou que não honraria o compromisso . O ex-governador Jaime Lerner então concedeu à Ferropar um diferimento de quase 74% de todas as parcela que venceriam entre 2000 e 2003, o que em valores atuais atingiria R$ 26 milhões, segundo a Ferroeste. Com o diferimento, o consórcio assumiu o compromisso de investir na aquisição de locomotivas e vagões e cumprir metas mínimas de transporte de cargas. No entanto, segundo a direção da Ferroeste S/A, o consórcio não cumpriu o acordo, nem realizou os investimentos em equipamentos, nunca atingindo as metas de transporte da produção do Oeste paranaense. Metas - Em 2003, por exemplo, a meta era transportar 3,1 milhões de toneladas, mas a Ferropar só atingiu 1,1 milhão. De 1997 a 2003, a meta era de 16,7 milhões de toneladas, mas não ultrapassou a 6,6 milhões. “Por culpa da Ferropar deixaram de ser transportados pela ferrovia mais de 10 milhões de toneladas nesse período. Considerando-se que um caminhão padrão comporta 25 toneladas, foram necessárias mais de 400 mil carretas para transportar a tonelagem que a Ferropar deixou de transportar”, afirmou o diretor administrativo, financeiro e jurídico da Ferroeste, Samuel Gomes. “Por isso os produtores foram obrigados a escoar a safra por caminhões, pagando mais caro pelo frete e diminuindo seus lucros. E o Paraná sofreu com o desgaste de sua malha rodoviária e com as imensas filas de caminhões na BR-277 e no porto”, garantiu ele. No início de 2004, a Ferropar deveria ter depositado a primeira parcela integral de pouco mais de R$ 3,2 que devia ao Governo do Estado pela exploração econômica de sete da Ferroeste. A Ferropar depositou R$ 553 mil e pediu mais seis meses para renegociar a dívida. Requião negou o pedido. “Eles tiveram sete anos para começar a pagar o que devem ao governo e ao povo paranaenses pela exploração da ferrovia. A Ferropar é uma empresa que fracassou”, disse o governador na época.

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